Texto de autoria de Rosicler Antoniácomi Alves Gomes, professora de português e inglês, Ponta Grossa.
Postada no Portal aRede em 08/06/2022.
Fui criança de 9 anos de idade, em 1964. Poderia ter crescido sabendo o que tinha sido "na real" a tão conhecida de nome Revolução de 31 de Março. Mas não.
Chegavam aos meus ouvidos tão somente os chiados do velho rádio, em que, às vezes, meu pai conseguia sintonizar até uma rádio do Rio Grande do Sul, transmitindo discursos de um tal de Brizola. Passando por outros chiados que eu detestava, vinham outros discursos de um tal de Lacerda, falando de Jango. E meu pai às vezes resmungava, assustadoramente: "Vai dar guerra."
Foi esse um dos contatos mais fortes que tive com essa Revolução. Algum tempo depois, a família se mobilizava a procurar em guardados antigos, em busca de alguma aliança de casamento ou outra joia de ouro, que pudesse ser doada para uma campanha que tinha por objetivo fortalecer o lastro-ouro da nação e valorizar a moeda nacional. Era a campanha ‘Ouro para o Bem do Brasil’.
Na ocasião, eu achava que esteve em Ponta Grossa o próprio presidente Marechal Humberto de Alencar Castello Branco, em pessoa, tal era a força da metonímia com que os adultos afirmavam que iam doar a ele o que possuíssem em ouro para salvar o Brasil. Acho que deram a aliança de meu pai, que ele não usava por trabalhar em serviços braçais.
Não encontrei no tio Google referência alguma sobre a presença de Castello Branco em pessoa em nossa cidade, promovendo essa campanha.
Pensando ter imaginado sobre a tal campanha, achei um blog interessante de um gaúcho, cheio de relatos de pessoas que caíram no engodo do ‘Ouro para o Bem do Brasil’. Tanta infância. Tantos tormentos nem sequer percebidos, que podíamos afinal vir a conhecer, mais tarde. Mas, não. Como eu disse antes, eu podia ter crescido sabendo de muitas coisas, mas não...
Sobre o destino das doações feitas pela população à campanha ‘Ouro para o Bem do Brasil’, existem notícias não esclarecidas e também abafadas sobre uma enxada de ouro de 8 quilates, valendo milhões de cruzeiros, que um fazendeiro de café de Londrina doou à campanha, que, segundo os boatos, teria sido encontrada anos mais tarde na posse da filha do próprio Castello Branco, como patrimônio da família. Todos esses pormenores poderiam ter sido esclarecidos, em tantas matérias divinamente picantes com que os jornais poderiam disputar audiência e visibilidade. Mas, não, quando a Paz custa, além de vidas, também a Liberdade.