segunda-feira, 9 de setembro de 2024

Direito: 70 anos

Texto de autoria de Sílvia Maria Derbli Schafranski, advogada e Mestre em Ciências Sociais pela UEPG, residente em Ponta Grossa.

Em 1954, Ponta Grossa, uma cidade de ares provincianos e ventos gelados, assistia ao nascimento de um sonho: o curso de Direito, que emergia como promessa de um futuro repleto de nobres causídicos. Mas havia um desencontro. A aprovação estava ali, no papel, mas a implantação só veio a acontecer nos idos de 1958, quando a primeira turma começou a trilhar os caminhos da graduação.

Os primeiros anos trouxeram nomes imponentes de vozes docentes que ecoavam pelos corredores da academia. Jugurta Gonçalves de Oliveira e Wilson J. Comel, com suas economias políticas, eram os arautos de um futuro incerto. Mário Lima Santos, com sua Teoria Geral do Estado, parecia moldar a própria argamassa do poder. E o Padre Miguel um sacerdote da lei, que ensinava Introdução à Ciência do Direito. Era uma época em que o Direito Romano, ministrado por Estevão Zewe Coimbra e Ducastel Hycz, ressurgia como um fantasma que se recusava a partir.

E havia mais: Lourival Santos Lima (Introdução à Ciência do Direito), Marino Brandão Braga, Fernando Bittencourt Fossler, e tantos outros, todos com seus saberes que mais pareciam segredos guardados a sete chaves. Durante as aulas cada palavra parecia esculpir o destino de uma nação. Mas o destino, naquele tempo, era de um só gênero: masculino.

O Brasil refletia as sombras de desigualdades. O adultério! Um crime que pesava mais para a mulher do que para o homem. A igualdade de gênero era uma promessa vazia da Constituição de 1946. O casamento, esse contrato inflexível, tinha na virgindade feminina o seu selo de qualidade. O divórcio? Impensável...

Quando a primeira turma do curso de Direito de Ponta Grossa finalmente recebeu a imposição de grau, em 21 de dezembro de 1962, os nomes que ecoaram no salão eram todos masculinos, dentre eles, meu tio Jorge Derbli, também Acácio Frare, Adelino G. dos Santos, Admar Horn, Alberto G. Pimenta, e tantos outros homens que entrariam para a história local.

O curso de Direito de Ponta Grossa iria representar um marco na região. Sua importância se destacava como uma luz que começava a brilhar preparando futuras gerações de juristas que moldariam o destino da sociedade. Contudo, naquela época, aquela trajetória era trilhada exclusivamente por homens. As mulheres ainda não participavam desse universo. Observavam, à distância, um mundo que, por ora, parecia não lhes pertencer, aguardando o momento em que também seriam reconhecidas e acolhidas na construção dos pilares da justiça.

3 comentários:

  1. Excelente memória, importante para todas nós, mulheres, nos lembrarmos de que a rebeldia que nos levou a uma revolução por direitos (incluso o Direito), embora mal vista na sociedade, já estava atrasada. É sempre hora de revoluções sociais.

    ResponderExcluir
  2. A luta da mulher por seus direito é histórica. Cada conquista é resultado de muita luta e longo tempo de espera. Já conquistamos direito importante como o de votar e ser votada. Continuamos buscando a igualdade de gênero.

    ResponderExcluir
  3. Orgulho-me de fazer parte desta história (turma 2012-16 na graduação e, depois, pós) - nesse período, como suponho que ainda seja, as paredes de algumas salas ainda traziam os escaninhos onde ficavam os gravadores na época do Regime Militar, que tolhia a liberdade de Cátedra e se irrogava a prerrogativa de monitorar os conteúdos das aulas.

    ResponderExcluir

Pedimos aos leitores do blog que desejem fazer comentários que se identifiquem, para que os autores conheçam sua origem.

Metamorfose

Texto de autoria de  Márcia Derbli Schafranski , professora universitária aposentada, Especialista e Mestre em Educação pela UEPG e Suficien...