Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes,
Professora aposentada, Ponta Grossa.
Postado no Portal aRede em 02/09/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 30/09/2020 e no Blog Mareli Martins em 23/09/2022.
Era compulsório. Juntar as tralhas e seguir o
chefe da família. Uma empreitada para jovens. Na bagagem, sonhos e esperanças.
Um filho no colo e outro na barriga. Em pé, na carroceria do caminhão, o
cachorro em cima de tudo, sem saber de nada. Fazia pose de quem acabou de
ganhar o cinturão de peso-pesado.
Às vezes penso que os animais são mais privilegiados
que os seres humanos. Seguem o dono sem saber o destino, porém têm cama, mesa e
banho gratuitos. O cachorro Waldick não era adepto do banho. Sempre fugia da
água como um gato. Um pratão de polenta com sobras de carne era bem melhor
aceito.
Foram parar em Castro, a terceira cidade mais
antiga do Paraná, um caminho de passagem dos tropeiros que cruzavam o Brasil
colonial. Com seus alicerces fincados no tropeirismo, ali ainda flutuava a
energia deixada por aqueles pioneiros. Uma bela cidade antiga, hospitaleira,
casario do século XVIII, a Igreja Matriz construída por escravos, o Museu do
tropeiro com respeitável acervo histórico. Capital do Paraná por três meses.
Nascida às margens do Rio Iapó, próximo do “vau”, um trecho menos profundo onde
era possível atravessá-lo montado a cavalo. O escritor princesino Ribas
Silveira mencionou em um poema: “O vau do Xapecó é tôrva corredeira/ tendo de
um lado o poço e doutro uma cachoeira/ quem passa por ali enfrenta a
guilhotina/ é preciso seguir as curvas do penhasco/ para não rolar no abismo e
virar churrasco/ à lontras, suruvis e aves de rapina.”
Decidiram viver numa casa em frente à Estação Ferroviária... Que decisão
corajosa! O barulho provocado
diuturnamente pela ferrovia, entretanto, não interferiu em que o menino
nascesse saudável e calmo.
De dia viam-se aquelas máquinas vermelhas puxando
muitos vagões que pareciam uma serpente de metal resfolegando e deslizando
pelos trilhos. À noite recebiam a visita infalível de muitos representantes da
figura símbolo de Castro: os sapos. Seres inofensivos, porém de aparência
amedrontadora. As galinhas espalharam-se pelo capinzal e por lá se
multiplicavam como coelhos. Frango e ovos eram fartos na mesa da família.
A prainha refrescava os domingos calorentos.
Vida pacata de cidade interiorana, vizinhança
solidária e amistosa. A ameixeira carregada de frutos amarelos fazia sombra
para a rede na varanda. Tudo isso tinha sabor de paz, de tranquilidade, mesmo
ousando conviver com os ruídos, em frente à Estação Ferroviária.
Marlene Castanho
ResponderExcluirSueli Fernandes,eu me deparei com "Andanças", embarquei no texto e já fui logo me situando... A cidade de Castro, impregnada de história, trás no currículo fatos relevantes e isso enriquece ainda mais os Campos Gerais... Mas ouvindo o barulho do trem, meu coração disparou...Meu querido pai, já falecido,era ferroviário...,e esse barulho me embalou numa agradável recordação...
Querida Marlene, seu comentário me aquece a alma! Meu texto despertou emoções e recordações de seu pai. E isto é maravilhoso! Obrigada.
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