Texto
de autoria de Marivete Souta, Professora, Ponta Grossa.
Postada no Portal aRede em 04/03/2020, publicada na Correio Carambeiense em 20/02/2021.
Postada no Portal aRede em 04/03/2020, publicada na Correio Carambeiense em 20/02/2021.
É
mais um dia de trabalho na mesma escola que me espera todas as manhãs. Nesse dia,
a pressa não me acompanha e posso ir observando o que há no percurso tão curto
entre minha casa e o local onde trabalho há tantos anos.
Meu olhar segue percorrendo o entorno das
ruas, passo pelo cemitério São João e penso no quão sou abençoada por poder
respirar esse ar fresquinho que enche meus pulmões numa manhã cheia de nuvens,
anunciando a música que mais gosto: o som da chuva. As poucas árvores que há em
frente às casas já estão desfolhando para deixar espaço para o nascimento de
novas flores.
Ao
lado da escola uma casa me espia todos os dias, mas hoje ela me chamou para
conhecê-la.
É
uma casa desbotada pelo tempo, decrépita, a sujeira impera em todas as
extensões que meus olhos alcançam. Percebo a fuligem, sinais que ficaram de um
incêndio que ocorrera ali. A causa foi uma fogueira feita pelos esporádicos
moradores que têm como cultural essa prática. O lixo se acumula por todos os
lugares e o odor é desagradável, demonstrando que não há condições básicas para
abrigar os fortuitos moradores.
A Casa do Índio – alcunha que tem sua origem
devido à serventia que a casa tem -, apesar de seu aspecto reprovável, é a
moradia temporária de indígenas que vêm a Ponta Grossa para vender seus
artesanatos.
Hoje, pela janela da alma, vejo essa casa e me
faço tantas perguntas que nunca fiz. Tantas
vezes passei por ela sem reparar que abriga fortuitamente cultura e história.
Penso
no chimarrão que tanto gosto... O consumo de erva-mate fria ou quente vem dos
indígenas, como também o preparo de alimentos com mandioca, milho e pinhão,
como o mingau, a pamonha e a deliciosa paçoca, que me enche a boca de água, alimentos
tão comuns em minha mesa.
Penso
na guabiroba de sabor doce e suave. No maracujá azedinho, no butiá amarelinho.
Capivara, jabuti, cutia, Goioerê, Candói, são palavras de origem indígena que
me vêm à mente. Nós absorvemos sua língua, sua cultura, e esquecemos deles, de
sua história, de sua contribuição cultural.
Apesar de terem tentado apagá-los de nossa
história, a cultura desse povo tão sofrido pela quase dizimação, permanece viva.
É uma ideia errada pensar que são um povo atrasado e primitivo, pois onde há um
indígena há cultura. O que se poderia fazer por eles? Creio que estaremos dando
o primeiro passo quando pararmos não apenas para olhar, mas para enxergar.
Marlene Castanho. 02-02-2020. Ponta Grossa. PR
ResponderExcluirFui conduzida muito bem pelos caminhos do texto... O percurso, tão conhecido meu, desta vez surpreedeu além da conta... Casa do Índio, ofuscada pela própria indiferença de todos nós, reviveu aqui para nós lembrar de que a raiz da nossa cultura continua viva, agonizando,ali dentro da casa; esperando que, uma hora ou outra, nos lembremos de rega-la com mais atitudes e gestos de gratidão. Parabéns a autora Marizete Souta.