segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

Rotina


Texto de autoria de Felipe Vieira da Silva, carteiro, Ponta Grossa.

Publicado no Portal aRede em 22/01/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 14/07/2020.
Mal o ônibus deixara o terminal central e, embaixo da passarela, um casal de velhinhos estava parado a contemplar o horizonte.
— Quem será que são? Todo dia estão aqui, o que será que fazem? Esperam alguém? Mas sempre nesse mesmo horário — pensava Roberto, enquanto se apertava e tentava se segurar em pé no ônibus lotado que o levava para casa, após mais um dia de trabalho.
— Será que mais alguém notou? — Olhou à volta e viu alguns rostos conhecidos; apesar de pegar o mesmo coletivo há meses, nunca puxara conversa com ninguém.
— Aquele vem de manhã… Esse desce um ponto antes de mim…
— Opa! — gritou um coro de secundaristas. Era a esquina das ruas Catão Monclaro com a Fagundes Varela.
— Qualquer dia desses um ônibus ainda capota nesse lugar — pensou — Nossa, mas todo dia eu tenho essa impressão… Espere, hoje acordei meio dormindo, tomei meu café requentado e corri para o ponto, acenei com a cabeça pro rapaz que sempre já está lá, meu vizinho veio correndo de novo, todo dia ele vem quando o ônibus já vem vindo, o mesmo bom dia ao motorista e ao cobrador ao embarcar, a mesma disputa pra tentar chegar ao lugar de sempre no fundo, as mesmas sacolejadas nos buracos das ruas, os mesmos números das casas passando pela janela, as mesmas pessoas embarcando nos mesmos pontos, o mesmo movimento no terminal, os mesmos ambulantes abrindo suas barracas, os mesmos estudantes a caminho do Regente pelo calçadão, o mesmo cumprimento aos colegas de trabalho que lá já estão — E percebeu que quem fazia a mesma rotina era ele, e não o casal de velhinhos que ficara pra trás.
— Talvez todo dia vejam algo diferente e se divirtam com as coisas bobas que acontecem todo dia por lá… Opa, meu ponto…
Desceu, seguiu para casa e, no caminho, esqueceu o que pensara; talvez amanhã, quando estiver voltando e ver o casal novamente, continue o raciocínio ou começará tudo de novo!

2 comentários:

  1. Róbison Benedito Chagas25 de janeiro de 2020 às 07:45

    Bom dia CRÔNICAS DOS CAMPOS GERAIS. Sem dúvida, a crônica de Felipe Vieira da Silva - ROTINA - é a mais significativa que já li. Um texto simples. Claro. Objetivo. Sem enfeites e, acima de tudo, com a temática clara. Falar sobre os Campos Gerais. Em seu texto, Felipe deixou bem claro para todos os leitores a "rotina" de sua cidade que ele conhece tão bem, através de seu trabalho. Também conheço o casal de velhinhos que fica o dia todo sob a passarela do Parque Ambiental e sempre me pergunto. O que fazem lá. Agora descobri. Eles prestam serviços aos olhos atentos e curiosos de um cronista como o Felipe. Parabéns aos organizadores das Crônicas dos Campos Gerais por dar oportunidade às pessoas de mostrar sua sensibilidade através da literatura. Róbison Benedito Chagas. 23.1.2020.

    ResponderExcluir
  2. Róbison, concordo com você. Adorei o texto. E concordo também que o projeto é excelente, comecei a escrever crônicas com esse projeto.

    ResponderExcluir

Pedimos aos leitores do blog que desejem fazer comentários que se identifiquem, para que os autores conheçam sua origem.

Heróis não morrem, são apenas esquecidos

Texto de autoria de Reinaldo Afonso Mayer , professor Universitário aposentado, Especialista em Informática e Mestre em Educação pela UEPG, ...