Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, professora aposentada, residente em Ponta Grossa.
Desconheço
criança, principalmente menino, que não goste de colher frutas do pé, de preferência
em terreno alheio. É uma aventura tão deliciosa quanto as próprias frutas. Um
pomar produtivo aguça a vontade de provar daquela fruta, nem que seja azeda. Os
laranjais da minha infância em terrenos urbanos eram “mato” como se dizia
quando se referiam à quantidade. Além de laranjas havia também ameixa, maçã,
pera, araçá, goiaba em muitos quintais. A rua da minha casa era cortada por uma
valeta onde corria água de um arroio e por ali só havia passagem para pedestres.
O fundo daquela valeta era de saibro vermelho com o qual os meninos faziam
bolinhas, colocavam ao sol para secar e usavam-nas como projéteis de seus
estilingues para atingir passarinhos com os quais disputavam as frutas. O
arroio nascia dentro do terreno de um senhor de meia idade que era invadido
quase que diariamente pelos meninos em busca de frutas no pé. Obviamente ele
detestava a invasão das crianças a seus domínios, o qual acessavam através de
uma cerca de arame farpado. O terreno, com a casa da família, era em frente ao
Açougue dos Carraro, na Rua Anita Garibaldi, e se estendia por dois quarteirões
até a minha rua. Pelas dimensões da propriedade o dono não dava conta de
enxotar os invasores pois eles se espalhavam por entre as frutíferas e, além do
mais, o senhor tinha um problema na perna e mancava, daí o apelido “Manquinho”.
Usava uma espingarda que dava tiros de sal nas nádegas da piazada, mas em vão,
eles sempre voltavam.
Numa
época de peras os meninos invadiram o terreno e o senhor soltou seus cachorros.
Rápidos como um raio, dois meninos subiram numa pereira e ficaram lá até o
anoitecer, pondo à prova a paciência do Manquinho. Impotentes, cães e dono se
retiraram desolados.
Certamente
as famílias não tinham ciência desses fatos até que os pais de um deles
souberam das travessuras do filho e de seus colegas. O Manquinho se postou numa
posição estratégica e agarrou um menino pela camiseta. Perguntou: - Você gosta
muito de pera, certo? Então vou te dar a maior de todas. Em seguida entalou uma
pera gigante na boca do piá deslocando seu maxilar. Chegando em casa, olhos
arregalados, quase sem respirar, antes de uma boa bronca, a pera foi retirada
aos pedacinhos com um canivete para liberar sua boca e encaixar novamente o
maxilar. Proibidos pelos pais e com medo das consequências, as incursões pela
dita propriedade diminuíram até cessarem definitivamente.
Corri este risco enquanto criança, muitas vezes. Depois de adulo também. Piazada era fogo. Grato pelo texto, Sueli.
ResponderExcluirCriança não tem noção do perigo e, por isso, aproveita mais a vida. Um abraço.
ExcluirSueli: sua crônica remete a tantas memórias de uma infância similar; gostosa mesma era a fruta da "casa do vizinho", aquela colhida da árvore, "sem prévia permissão"; doces aventuras que hoje, ao lembrar, "dá água na boca!" Show de escrita! ALFREDO MOURÃO
ResponderExcluirAdorei a crônica e faço minhas as palavras do sr. Alfredo. Meus furtos da infância foram poncãs, tangerinas, uvas, laranjas, melancia, entre outras.
ExcluirComo eram doces as frutas furtadas!
Fico também com água na boca (hehehe)!
At.te
Até melancia, Antonio? Nem posso imaginar com conseguia essa proeza. Agradeço muito o seu comentário. Um abraço.
ExcluirA fruta do vizinho sempre era melhor. As recordações são muito boas, né, Alfredo? Um abraço.
ResponderExcluirAmiga do céu! No início, pensei que estava lendo histórias dde aventuras d!a minha infância. Meninos da minha vizinhança também passavam por esses perrengues com um senhor que também usava uma dessas espingardas. Mas com o horror de um maxilar deslocado com risco de asfixia, já vi que estava em outra "sessão da biblioteca".
ResponderExcluirPerdão pelo gaguejo no comentário...
ExcluirNa sessão de histórias de terror, provavelmente. Aquele dia foi tenso! Meus irmãos faziam parte do grupo, mas não passaram por semelhante perrengue. Beijo, Rosicler.
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