Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, professora aposentada, residente em Ponta Grossa.
Crocheteiras,
bordadeiras ou tricoteiras garantem que para desatar um nó no fio ou na lã,
basta pensar numa pessoa fofoqueira que ele desata facilmente. Não foi assim
tão fácil para uma parente que me relatou sobre os nós que desatou de sua
própria história. Foram necessários anos de pesquisa para que a luz desfizesse
a dúvida que pairava sobre a origem de seu avô materno. A família acreditava
que o jovem que chegara à cidade vindo do Rio Grande do Sul, fosse descendente
de espanhóis. Aqui se casou e teve três filhos. Após incansáveis buscas ela
puxou o fio da meada e desvendou toda a história do avô. Na verdade, o jovem
havia nascido no Curdistão, portanto era um curdo e, pelas constantes invasões
da vizinha Turquia ao seu território, fugiu com os pais para a Alemanha. Mais
tarde, pelo porto de Barcelona, imigrou sozinho para o Brasil, aos 30 anos de
idade. Falava alemão e é sabido que em meados do século XX os alemães aqui não
eram bem-vindos, não podiam se reunir com compatriotas, eram até presos se fossem
flagrados falando alemão em lugar público. Ele dizia que havia perdido seus
documentos, uma maneira de proteger-se escondendo sua identidade. Entretanto,
para casar, era imprescindível ter documentos para realizar o ato civil. Um
cartório providenciou novos documentos com o nome que ele declarou:
Fernandes. A certidão foi lavrada e
nunca houve contestação.
Muito
trabalhador e com espírito empreendedor criou a primeira empresa funerária da
cidade, situada à Rua Theodoro Rosas (provavelmente). Um dos filhos conta que a
funerária do pai ficava em frente à residência da família Wagner, os meninos
brincavam juntos conservando a amizade até a idade adulta.
Mais
tarde o imigrante construiu uma vulcanizadora de pneus com o nome de
Vulcanizadora Cruzeiro, na Rua Saldanha Marinho. O Sr. Fernandes era possuidor
de uma personalidade agressiva, brigava à toa, do tipo que não levava desaforo
para casa. Talvez por esse motivo o casamento dele tenha durado menos de uma
década e veio a inevitável separação do casal.
O
sobrenome declarado passou por três gerações até que a pesquisa revelasse seu
verdadeiro nome. Contingência de um passado remoto que se extinguirá com o
tempo. Entrei para essa família pelo casamento com o filho do Sr. Fernandes
quando ele já não estava entre nós. Levou para a sepultura histórias que
deixaram de ser contadas, vivências desperdiçadas, restando apenas um sabor
amargo de não pertencimento.
Sueli M B Fernandes: já não me lembrava do "desata nó", mas você me fez recordar falas da minha avó Maria Ricardo Clausen. Segundo ela bastava invocar um nome, e a sequência de nós sumia, feito mágica. Muito bom! ALFREDO MOURÃO
ResponderExcluirBelo texto, Sueli, abração.
ResponderExcluirObrigada, Murilo. Abraços.
ExcluirTantas histórias que merecem ser contadas nesses Campos Gerais! Esse nó curdo-alemão-espanhol realmente não seria desatado evocando-se um único nome de pessoa dada a fofocas. Acredito nessa história, Sueli, porque sei que você não é fofoqueira! Parabéns pelo texto!
ExcluirObrigada, Rosicler. Que bom que você sabe que meu nome não desata nós. rsrsrs
ExcluirDesde o tempo de nossas avós até hoje essa ajuda é pedida. Já comprovei que não falha. Obrigada, Alfredo.
ResponderExcluirParabéns, Sueli!! Amei ler sua Crônica, levou- me ao passado , quando ouvia as histórias de um certo Senhor "Germano Shubert", por sinal, passou a ser meu tio, bastante interessante. Acho que vou relatar a você, Sueli !! Para dar continuidade às Crônicas sobre os imigrantes alemães.
ResponderExcluirAgradeço seu comentário. Feliz que tenha gostado da leitura e de tê-lo conduzido a um passado com história semelhante.
ExcluirBela história. Nem sempre as coisas são como pensamos saber. Parabéns.
ResponderExcluirA vida nos surpreende, possui milhões de facetas desconhecidas. Agradeço o comentário.
Excluir