Texto de autoria de Murillo Emanuel de Lara, estudante de Administração da UEPG, Ponta Grossa.
Postada no Portal aRede em 06/10/2021.
Seu Joaquim estava em casa, era sexta-feira e sua filha
Aline e o namorado dela, Jonatan, vieram para o café da tarde. Não é segredo
para ninguém que Seu Joaquim não se bicava com o genro.
Estavam sentados no sofá enquanto as mulheres preparavam
o café. Vez ou outra eles se olhavam, mas não tinham assunto; nenhum que os agradasse.
Foi quando Jonatan arriscou:
— E o senhor ficou sabendo da privatização dos Correios,
Seu Joaquim?
— Sim, eu li algo sobre isso nos jornais. — Seu Joaquim
era assinante fiel da Gazeta do Povo, recebia todos os dias em sua casa um
exemplar do jornal impresso, mas ele estava começando a ler as colunas on-line,
mas ainda estava engatinhando nesse processo.
— Pois é, né — comentou Jonatan —. Agora esse povo vadio
trabalha.
— Como é, meu jovem? — perguntou Seu Joaquim se
inclinando para a frente.
— Ah, esse povo concursado dos Correios. Todo mundo sabe
que eles não trabalham e quando trabalham ainda não fazem direito. Quem sabe
com essa privatização eles acordem, ou estarão logo no olho da rua.
— Você acha que é simples assim, rapaz?
— Não, claro que não. Mas já poupa o governo de ficar
investindo neles.
— Sim, o governo não precisa mais investir, mas então
quem que passa a ser o investidor direto? O povo com os novos valores cobrados.
— Sim, mas... — antes que ele pudesse terminar, Seu
Joaquim continuou:
— E de onde você tirou esse papo de que eles não
trabalham?
— Bom, uma vez uma encomenda minha atrasou cinco dias. Em
uma empresa privada isso não aconteceria.
— E por causa de uma encomenda ruim você vai julgar todos
eles?
— Bom...
— E quanto àqueles que ficarão sem emprego e têm família
para manter?
— Acho que eles conseguirão outro emprego, né?
— Você acha? — perguntou Seu Joaquim sarcástico. —
Meu jovem, eu que sou velho sei que isso é furada, e olha que eu aprendi ontem
a como ver um vídeo no Youtube.
— Eu consigo ouvir vocês lá da cozinha — disse Aline. — Além
do mais, pai, essa privatização vai gerar muitos empregos novos.
— Sim, mas e os que serão demitidos? Trocará seis
por meia dúzia, minha filha.
— Pai, podemos ir comer, por favor?
— Tudo bem, vamos. — concordou Seu Joaquim. Mas quando
ele se levantou, ouviu uma moto encostar na frente da sua casa.
— Eu vejo quem é — disse Joaquim indo em direção à porta.
Quando ele voltou para dentro, já estavam todos à mesa.
— Quem era, meu velho? — perguntou Marta.
— Era o carteiro com nossos boletos. — respondeu Joaquim
olhando torto para Jonatan.
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