Texto de autoria de
Sueli Maria Buss Fernandes, Professora aposentada, Ponta Grossa.
Publicada no Correio Carambeiense em 13/06/2020, postado no Portal aRede em 22/07/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 19/20/2020.
Publicada no Correio Carambeiense em 13/06/2020, postado no Portal aRede em 22/07/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 19/20/2020.
Na
tarde morna e preguiçosa me recosto na rede pendurada em galhos de amoreira,
fecho os olhos e me transporto ao passado; revisito minha infância de múltiplas
facetas. A igreja e suas festas ruidosas, alvorada festiva com foguetório às
seis da manhã de domingo acordando os fiéis. As brincadeiras de roda, pipas,
bilboquês, amarelinha, que se harmonizavam com crianças despreocupadas.
Brincadeiras que vivem no porão da saudade.
O
pensamento errante, sem direção definida, percorre ruas de chão batido onde
pular corda levantava poeira, mas era diversão garantida. Vai pelas trepadeiras
dos jardins da vizinhança; o ponto de ônibus na rua principal. O armazém de
secos e molhados do seu Inácio na esquina da minha casa, que provia todo o
bairro, imprescindível para que a vida seguisse seu curso.
Adentro ao armazém. Um longo balcão de madeira em forma
de L, lavado à noite pela esposa. Crianças na pontinha dos pés, agarradas ao
balcão, com os olhos fixos na vitrine de doces que aguavam a boca. Suspiro,
paçoquinha, cocada, pé de moleque, que sobreviveram até as festas juninas de
hoje.
O
armazém de secos e molhados vendia de tudo. Para dor havia Cibalena. Para
mal-estar, amoníaco. Agulha, colchete, elástico e botão não faltavam. Cereais a granel entregues ao freguês em cartuchos de papel,
bebidas, tubaína, capilé, garrafas de leite com rolhas de cortiça, pepino azedo
caseiro e pão d'água que, por sua estética peculiar, era vendido até em
metades. Comprar dois pães e meio era possível. Num cabo de vassoura na
transversal os “salgados” ficavam expostos.
Na
ponta do balcão, mais ao fundo, alguns homens naquele que era o ponto de
encontro para tomar uma cachacinha, conhaque ou Fernet depois do trabalho. As
comadres comentando no portão: Sabe que eu vi o marido da Lurdes bebendo no
armazém? Coitada! Com aquele barrigão de oito meses e ele nem aí! Ainda bem que
sempre leva uma mistura para a janta!
Uma
menina sai do armazém equilibrando um copo cheio de óleo de soja. Derrama um
pouco na barra da saia, molha a ponta dos pés. A mão desliza, troca de mão,
respinga, mas chega em casa com o suficiente para o molho da maionese de
domingo.
O
sol se despede do dia; pouco a pouco se acomoda no poente. A nostalgia dá lugar
à realidade; me aconchego mais à rede que me abraça e me entrego nos braços do
ocaso.
Marlene Castanho
ResponderExcluirUma infância assim, para quem vivenciou, sempre será uma doce e intrigante lembrança... O Armazém de secos e molhados então, era como se a criança entrasse num ambiente mágico... Emoções assim estendiam-se às festas juninas... Ah, Sueli, li sua crônica com tanto gosto que, ao sentir o abraço gostoso da rede, até suspirei... Parabéns!
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPrezada Marlene. É uma satisfação saber que meu texto a emocionou e que sentiu prazer em lê-lo. Grata por este comentário tão agradável. Sueli Fernandes
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