Texto
de autoria de Juliano Lima Schualtz, estudante de História da UEPG, Ponta
Grossa.
Publicado no Diário dos Campos em 22/06/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 25/08/2020, postado no Portal aRede em 23/09/2020.
Publicado no Diário dos Campos em 22/06/2020, lido na CBN Ponta Grossa em 25/08/2020, postado no Portal aRede em 23/09/2020.
Os
velórios em cidade pequena sempre seguem uma ritualística simples. Mesmo o
morto em vida sendo pouco aplaudido, quando defunto já se torna celebridade ao
ser anunciado na rádio local. Os familiares próximos e distantes, os amigos
próximos e distantes, os inimigos próximos e distantes, as viúvas próximas e
distantes, os cães próximos e distantes, os bêbados próximos e distantes. Todos
se coagulam na comunhão sepulcral que antecede o enterro.
No transcorrer do velório, as estórias com o falecido ganham vida. É o momento de
rememoração e fabulação de uma vida que pulsa nos entes próximos. Alguns chovem
na pupila e outros para não chover resolvem rir com alguns causos:
palavra-guarda-chuva. De qualquer modo, é sempre um momento de inquietação e
luto, cada qual à sua maneira.
Enterrar
os mortos é essencial para a manutenção sentimental dos vivos. Visualizar o
defunto contornado pelas flores e sua face pálida inscrevendo a presença da
ausência na fotografia eterna e precisa antes das pás de terra cobrirem o
caixão. Depois, bem, depois cada defunto é machadiano do seu jeito.
Mas...recordo
de um relato... estipulado por um morador de Tibagi, contou-me assim:
“Quando
o avô do Afonso veio a fenecer, ele me relatou o último momento com o senhor
Isaías. Ambos não se viam com constância, afetos mutilados e vidas em
encruzilhada. Contou-me que o velho cão passou a latir convulsivamente
lamentando a ausência carinhosa das mãos rugosas de Isaías. As unhas do gato
caíram, arranhou muito a cadeira que sentava o Isaías. As cordas da viola:
rebentaram. Só as unhas de Isaías podiam tocá-las. A garrafa de aguardente:
secou. Só os lábios pardos de Isaías bebericavam aquele líquido ardido. A gaita
de boca perdeu a sonoridade, apenas o sopro de Isaías conseguia tragar som
daquele instrumento. As flores e mandiocas não mais cresceram, as flores
recusavam outras pupilas e as mandiocas negavam outros músculos. No último
momento, Isaías, de pele crepuscular: anoiteceu.”
Marlene Castanho
ResponderExcluirEis o mistério da morte: ela é fiel, não deixa ninguém para trás, e, por mais insignificante seja o morto, sempre ficará um outro ser vivo lamentando sua partida... Bem assim... Parabéns,Juliano!