segunda-feira, 2 de outubro de 2023

Brabeza

Texto de autoria de Mário Francisco Oberst Pavelec, técnico em agropecuária, natural de Palmeira, residente em Ponta Grossa.

Postado no Portal Culturação em 10/10/2023, no Portal aRede em 21/11/2023, e publicado no Diário dos Campos em 04/10/2023.

Nascer e crescer em Palmeira é um privilégio de uma parcela da população dos Campos Gerais não muito ampla. Modestamente, admito ser parte destes, ou diria melhor, orgulhosamente me identifico palmeirense.

E, claro, tenho também minhas histórias, as histórias de um moleque “brabo”, que nasceu em casa, tinha a honra de vizinhar com os Kardush, Dona Linda e seu Assad, poder caminhar tranquilamente até a Praça Marechal Floriano, ou ir sozinho, com 5 ou 6 anos, até o pré-primário do Colégio das Freiras, que também nos vizinhava. Nos fundos de casa, além do pé de ariticum, já proseado aqui, a Rádio Ypiranga nos fornecia gratuitamente suas melodias e noticiários.

Dentre outras memórias, despertas pelo desejo de “cronicar”, lembro-me de ir até o Seu Paulo, o barbeiro que sempre cortava os cabelos masculinos de nossa casa, subindo a Conceição, quase na porta da rádio, vestido com uma camiseta do Coritiba F. C. Ao chegar lá, minha mãe, como de hábito pede a ele um corte bem caprichado, bem curto, “pra aproveitar bem o dinheiro, hein seu Paulo”. Ele olha para mim e me pergunta: “então, você é coxa branca?”. O moleque, muito “brabo” mostra a perna, e responde beiçudo: “eu não sou coxa branca...”. Deveria eu ter cerca de quatro ou cinco anos, e não fazia a mínima ideia do significado desta alcunha.

Minha mãe conta ainda que, talvez com um pouco menos idade, esse moleque, após ser repreendido em casa, alguma travessura certamente, saiu emburrado, com as mãos para trás e tomou o rumo Conceição acima, não dando bola para ninguém. Ela me seguiu, e, divertindo-se com seu rebento, acompanhou esta aventura. Relata que ao passar pelo Seu Paulo, que sempre “mexia” comigo, não me importei. Segui firme em meu propósito de “fugir de casa”. Passo a rádio, caminho, caminho, caminho, passo a Agottani, continuo até chegar em frente ao Cemitério. Naquela época, a Conceição não era calçadão como hoje. Bem, lá eu paro, provavelmente cansado, e já com o coração mais calmo, olho para minha mãe e falo: “mãe, vamos voltar para casa?” Ela me toma pela mão, e descemos a Conceição novamente.

Minhas irmãs sempre reclamaram que as botas ortopédicas que me obrigavam a usar para corrigir o “pé chato”, eram verdadeiras armas em meus pés. Os hematomas nas canelas delas, quase sempre eram consequências de um moleque bem “brabo”.

Não era fácil esse moleque!

19 comentários:

  1. Muito.bom. lembrei de pedaços da minha própria infância
    Parabéns 👏👏👏

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  2. Sua crônica me lembrou de uma história engraçada e parecida que minha mãe viveu com o meu irmão mais novo. Na época ele tinha quatro anos.. Em uma bela manhã, minha mãe ficou distraída com alguma tarefa... E quando foi ver ele tinha aberto o portão e estava subindo a rua correndo porque queria ir na casa da vó, segundo ele... E como a mãe não queria levá-lo ele decidiu ir por conta própria

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  3. Mário, lembro perfeitamente das suas botinhas pretas... super pesadas. Era brabo mesmo 😂

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    1. Ah, esqueci de contar que minhas primas também eram vítimas destas botinas!!!

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  4. Lembro das suas botas também. Lembro também da "venda", onde compravamos sementes de girassol 🌻

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  5. Os moleques de 4 anos fugiam de casa, mas eu... fui uma moleca de 3 anos de idade, que, puxando um carrinho de bonecas feito por meu pai, disse a uma senhora da nova vizinhança que estava indo "para casa", pois não queria ficar na casa nova. Era o dia da mudança, todos muito envolvidos com a descarga do caminhão, só deram conta da fujona quando a nova vizinha veio comigo pela mão, me trazendo de volta. Ah! Lembranças da infância! Um rico texto! Parabéns!

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  6. Que boas recordações, desse menino! Coitadas das tuas irmãs, Mário. Precisa pedir muitas desculpas pra elas. Eita menino brabo!
    Por que será que era tão brabo, esse menino?
    Parabéns, Mário!

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  7. Grato, Simone. Talvez por ser o caçula, sempre mais mimado!!!

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  8. Creio que você gastou toda a sua brabeza, as botinadas e as tentativas de fuga na infância. Não sobrou nada, por isso hoje é amável e nem um pouco brabo.

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  9. Isso não é uma verdade absoluta. Trato bem quem me trata bem!!! hehehe

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