Texto de autoria de Alfredo Mourão, aposentado, graduado e especialista em Letras - UEPG, criador de textos e contador de histórias, residente em Ponta Grossa.
De repente me vejo em meio a muita
palha de milho: rústicas, pigmentadas, leves, soltas, habitando todos os becos
da Casa do Artesão de Ponta Grossa. Enquanto proseio com as artistas da palha –
Maria, Odete, Vanderli e Andreia –, sentindo o cheiro, a textura, a essência, me
afundo nas memórias da infância, como se afundasse no macio colchão de palha
que pinicava, coçava, tão quentinho nas madrugadas frias do Cará-Cará e
Olarias. E lá estou eu de enxada à mão, carpindo
o milho miúdo, crescendo teimoso, abrindo-se em verdes braços, bebendo do sol
majestoso. Me abraço às canas. Me bailo com as bonecas de milho de cabelos dourados
avermelhados. Me afogo em uma espiga de milho assado e um perfumoso café
tropeiro. Há grandeza na ancestralidade do milho! Há riqueza na rusticidade do
milho, quando se transforma!
Entre prosa e risos, a palha
encorpada se estica preguiçosa, se enrola teimosa, se ajeita jeitosa aos
rasgos, picotes, puxa-puxa, mesclando-se faceira nos arranjos de folhas e
flores desidratadas, galhos secos, cascas e sementes da terra boa: surge
arteiro o artefato brejeiro! Simples e sofisticado! Popular e chique! Então me
deleito em estar bem ali, ao lado daquelas mulheres criativas e plenas de
histórias pra contar. E me encanto a cada palha transformada.
Nos idos 2000, a artesã Adelaide (s.m.)
deu as primeiras formas à palha do milho por aqui. A palha deixou-se moldar,
acarinhada por dedos habilidosos de mágicas mãos femininas: brincos, adornos,
guirlandas, arranjos, personagens religiosos, personagens lendários. A natureza
e a cultura paranaense estimularam a pesquisa, que inspirou a criação, que se
tornou fruição do patrimônio imaterial da nossa gente.
Hoje, o artesanato da palha do milho
festeja sua salvaguarda artística, brilhante e oportuna iniciativa do Conselho
Municipal do Patrimônio Cultural, oficializada em agosto de 2022. Esse
pertencimento é motivo de festança, pois é nossa identidade cultural.
Deliciosa viagem às brincadeiras de infância!!!
ResponderExcluirTexto agradável, repleto de lirismo, de leveza e de boas recordações dos tempos idos.
ResponderExcluirMuito bem, meu amigo. Texto maravilhoso. Há poesia na sua prosa e você sabe trabalhar bem as palavras, assim como as trançadeiras da palha do milho!
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