segunda-feira, 26 de abril de 2021

O xixi do imperador

Texto de autoria de Rogério Geraldo Lima, empresário, redator e radialista, Palmeira.

Postada no Portal NCG.news em 27/04/2021, no Portal D'Ponta News em 13/05/2021, no Portal aRede em 26/05/2021, lida na CBN Ponta Grossa em 30/04/2021 e publicada no Diário dos Campos em 26/09/2022.

O imperador D. Pedro II visitou a Província do Paraná em 1880. Sua Alteza e a imperatriz Tereza Cristina desembarcaram em Paranaguá. Depois foram a Antonina e Morretes antes de subir a serra rumo a Curitiba. Da capital, a comitiva imperial seguiu para Campo Largo. Mas, é depois de completar a subida da Serra de São Luiz do Purunã, nos contrafortes da Escarpa Devoniana, já nos Campos Gerais, que começa a parte mais deslumbrante da visita do imperador à Província.

Mês de maio, outono chuvoso, neblina suspensa e a lama atolando rodados das carruagens. Nas cabines, imperador e imperatriz, bem como demais nobres da comitiva, vestiam seus camisolões brancos de algodão a fim de evitar respingos em seus trajes. Vez por outra, estimulados pelos solavancos das estradas, as paradas serviam para um salutar esticar de pernas e um alívio para as bexigas, nobres e plebeias.

Dias após ler sobre a visita do imperador, ouvia Trilhos urbanos, música de Caetano Veloso, quando ele canta: No cais de Araújo Pinho / Tamarindeirinho / Nunca me esqueci / Onde o imperador fez xixi.... Indaguei meus cadarços do tênis: ─ Onde o imperador fez xixi aqui, nos Campos Gerais?

Com o mapa em mãos, fui traçando com a ponta dos dedos o trajeto da comitiva pelas antigas estradas da Província. De Campo Largo até a localidade de Tamanduá, a possibilidade era de a parada ter sido próxima à antiga capela. Porém, o imperador profanaria as cercanias do templo religioso, mesmo com sua urina real? Talvez a primeira parada para o alívio dos membros da comitiva tenha sido nas imediações da portentosa ponte de pedra sobre o rio dos Papagaios, local mais aprazível para Sua Alteza desfazer-se do líquido retido na bexiga.

Meu dedo correu o mapa, tocando em pontos prováveis nos quais o imperador poderia ter feito xixi. Na passagem do rio Tibagi entre Palmeira e Ponta Grossa? Antes ou depois de cruzar o rio Pitangui, entre Ponta Grossa e Carambeí? Logo após a recepção em Castro, nas proximidades da Chácara Bailly? Na ida à Lapa, na passagem da corredeira do Caiacanga, em Porto Amazonas?

Nenhum registro nos diários de viagem, nenhuma plaquinha indicativa.

A dúvida e a decepção remetem a questionamentos outros, embora ainda fisiológicos, sobre os alívios de Sua Alteza. Não fosse pela profusão do banal xixi, aqui e ali, com o devido perdão à escatologia, os locais em que o cocô imperial foi ao solo mereceriam ou não placas de identificação para a visitação pública como atrativos dos Campos Gerais?

terça-feira, 20 de abril de 2021

Divagando

 Texto de autoria de Sueli Maria Buss Fernandes, Professora aposentada, Ponta Grossa.

 Lida na rádio CBN Ponta Grossa em 23/04/2021, publicada no Correio Carambeiense em 24/04/2021 e no Diário dos Campos em 05/05/2021, postada no Portal D'Ponta News em 06/05/2021 e no Portal aRede em 12/05/2021.

Fim de festa no clube campestre. As luzes começam a apagar-se. Somente a lua cheia ilumina fracamente as mesas onde há pouco houvera uma comemoração. O silêncio impera, os convidados se foram. Toalhas de linho branco usadas em eventos especiais refletem a luz da lua, pratos com resquícios do que foi servido, algumas taças de vinho tombadas sobre as toalhas, pingos do líquido roxo a manchá-las de rosado. A piscina silenciosa adornando o cenário parece alheia ao que acontece. Tocados pela brisa, objetos infláveis balançam suavemente na água azul, da piscina do Verde.

Tiro o paletó, deixo a gravata mais frouxa, e me sirvo de mais uma taça de vinho. Vou degustando-o lentamente, sozinho com meus pensamentos. Sobre a mesa um saca-rolhas, objeto de utilidade única. Tomo-o nas mãos e passo a analisá-lo, entre um gole e outro, observando seus detalhes aos quais nunca havia dado importância. Uma alça para apoiar a mão com firmeza e uma sucessão de curvas, como uma serpentina, até a ponta aguda e cortante. As ranhuras do saca-rolhas se engancham na cortiça da rolha e arrancam-na como um fórceps. Gritos de alegria, taças ao alto e vivas a algum fato que se esteja comemorando.

O vinho é uma bebida socialmente aceita por homens e mulheres. Ao redor da mesa num almoço familiar o vinho acompanha a tradicional macarronada. Se alguém chama para uma pizza é comum que um convidado chegue com uma garrafa do indefectível líquido. Por sua cor intensa o vinho denota paixão, é um elemento de sedução e de conquista. Fatalmente estará na taça de alguém que se embriague de amor e se desiluda com ele. Baco, deus do vinho, foi o primeiro a sentir o sabor da bebida feita com a uva cruelmente amassada e depois fermentada.

Continuo manipulando o objeto e lembro da música de Roberto Carlos sobre as curvas da estrada de Santos. Quase uma analogia a um saca-rolhas. Como voam meus pensamentos! Passam pela Chácara Sozim, produtora de uvas, de suco e de vinho coloniais, usando técnica artesanal herdada dos antepassados. Pelas parreiras com enormes cachos trapezistas. Pela Fesuva, nossa tradicional festa anual da uva que busca fomentar a produção familiar da fruta. Pelas delícias comercializadas numa feira organizada pela cidade.

Minha taça está vazia e a alma leve. O sol pede licença para assumir seu turno enviando os primeiros raios dourados. Carrego meu paletó num ombro só e caminho pela rua deserta em direção ao centro de Ponta Grossa.

segunda-feira, 12 de abril de 2021

Beleza e história dos Campos

Texto de autoria de Bianca Lourenço Caputo, estudante de Serviço Social da UFPR, residente em Ponta Grossa.

Lida na CBN Ponta Grossa em 16/04/2021, publicada no Correio Carambeiense em 17/04/2021 e no Diário dos Campos em 21/04/21, postada no Portal aRede em 28/04/2021, no Portal D'Ponta News em 29/04/2021, e no Portal CulturAção em 30/08/2022.

Ali, naquela manhã de inverno ponta-grossense, estava Edgar, com sua bicicleta. Andava sem um destino certo, apenas relaxando e espairecendo a mente. Olhava de quando em quando o céu, claro e bem azul, sem nuvens, ainda com traços do amanhecer daqueles campos gerais, onde os primeiros raios de sol nascem por entre as araucárias. Pedalava calmo e paciente, enquanto o sol se erguia cada vez mais no horizonte, começando a aquecê-lo e deixar o dia mais bonito.

Depois de percorrer uma distância considerável, Edgar parou sua bicicleta, desceu e observou sua volta. Estava em um alto morro, com uma vista incrível que abrangia vários campos ondulados com alguns animais pastando. Plantações brincavam com a brisa fraca. A grama era amarelada, uma espécie de palha que crescia baixa e brilhava com um tom cor de ouro. Observando aquela imensidão se pôs a imaginar quantas belezas naturais não estariam escondidas por trás daquela natureza toda. Nascentes, cachoeiras, pedras forradas de musgo e lindas flores brotando. Cavernas e furnas, monumentos geológicos que só o tempo pode esculpir.  Aquele chão forrado de histórias passadas, de passos antigos e até mesmo de antigos mares e animais marinhos que lá numa época longínqua habitaram! Fascinado com esses grandiosos pensamentos se pôs a conversar consigo e com as abelhas que por lá passavam:

— É, agora tenho certeza, é por essas coisas que vale estar vivo! — disse, erguendo os braços e respirando bem fundo todo aquele ar gelado e puro daqueles belos e preciosos campos.

No caminho de volta, estava mais atento e observador. Foi imaginando como chegaram ali os primeiros tropeiros, montados em seus cavalos, trazendo consigo uma reserva de erva-mate e algumas moedas. Pensou também como seria viver numa época onde várias florestas de árvores nativas ocupavam aquela região. De pouco em pouco foi se sentindo cada vez mais integrado em toda aquela cultura que estava enraizada ali, na cidade, nos campos, dentro dele mesmo. E mais uma vez falou para si:

— Como é bom estar em casa.

terça-feira, 6 de abril de 2021

O fantasma e a bruxa

 Texto de autoria de Luciano de Oliveira, Professor de Língua Portuguesa, Ponta Grossa.


Postada no Portal NCG.news em 08/04/2021, lida na CBN Ponta Grossa em 09/04/2021, publicada no Correio Carambeiense em 10/04/2021 e no Diário dos Campos em 22/09/21, postada no Portal D'Ponta News em 22/04/2021 e no Portal aRede em 05/05/2021, exibida na TV Educativa em 30/12/2021.


O fantasma ao qual me refiro, caro leitor e leitora, é o time do Operário de Ponta Grossa no Paraná, e a bruxa é o dia 31 de outubro de 2020, do qual esperávamos a primeira vitória da equipe alvinegra, sob o comando do novo técnico, Matheus Costa, sobre o Botafogo de São Paulo.

Almejava sinceramente, assim como todos os torcedores, que o fantasma vencesse a bruxa solta em campo e conseguíssemos pelo menos um mísero 1 a 0, afinal, o grito de gol está preso na garganta, desde quando o Gersinho ainda era o técnico.

A bruxa não apenas sobrevoou o estádio, mas por duas vezes impediu que a bola fosse no fundo da rede do adversário, ao usar sua vassoura como trave, lugar preferido para seu poleiro. Isso só para citar alguns exemplos. Foram duas gargalhadas assustadoras, daquelas de bruxa solta.

Para o Botafogo de São Paulo, o fantasma só assustou mesmo. Engano pensarmos que a bruxa estava ao lado deles, senão a vitória adversária seria certa. Nós, operarianos, também nos arrepiamos de medo, pois a bola passou muito perto do poleiro das bruxas em nosso campo durante o jogo.

Entusiasmado, queria que o fantasma superasse a bruxa, para que neste momento, querido leitor e querida leitora, vocês estivessem lendo um relato com exaltação e elogios que merecem nosso time e toda sua maravilhosa equipe, porém, com outro tom, o da vitória, mas findo o jogo, eu descobri o motivo da treta.

Ainda, durante os primeiros momentos da partida, ouço que alguém bate à nossa porta aqui em casa. Com um olho na tela e outro na visita “inesperada”, percebo vozes infantis num único coro...

─ Doçuras ou travessuras? Lógico que naquele momento, com o coração na mão, em pleno horário do jogo amargo, não me daria ao trabalho e ao luxo de responder doçuras. Respondi travessuras! Nem pensei nas consequências. As crianças saíram tristes, de cabeça baixa, e seguiram para novas aventuras infantis do halloween. Se arrependimento matasse, eu estava mortinho neste momento!

Nem havia reparado que se tratava do ‘dia das bruxas’, visto que a vingança viria justamente em cima do fantasma. Foi o que aconteceu. Notaram o motivo das gargalhadas da bruxa? Lembrem-se de que no dia 31 de outubro, especialmente quando o fantasma estiver em campo e as crianças questionarem, doçuras ou travessuras, deveremos responder, carinhosamente, doçuras! Daí quem sabe as bruxas tornem-se nossas amigas e nos façam felizes pelo menos numa noite assombrosa de final de mês.   


O tempo é o senhor da razão

Texto de autoria de  Sílvia Maria Derbli Schafranski , advogada e Mestre em Ciências Sociais pela UEPG, residente em Ponta Grossa. Dies po...