segunda-feira, 8 de maio de 2023

O lixão

Texto de autoria de Jeferson do Nascimento Machado, professor da rede pública, historiador, residente em São João do Triunfo.

Postado no Portal CulturAção em 09/05/2023.

Ali naquele pequeno recanto rural, situado na urbe de Imbituva, denominado de Jararaca, vivi parte da infância e da adolescência. Eu e outros três irmãos revirávamos as florestas locais, encontrando cachoeiras, cavernas e locais de mata semi-virgem. Era sempre uma aventura, uma afirmativa da vida, um ato corajoso diante do desconhecido.

Mas, algo que nos chamou bastante atenção foi a descoberta de um lugar peculiar que, aos olhos da comunidade local, era um amontoado de restos e entulhos, que atraía todo tipo de urubu, de ratos e de homens-gabirus. Porém, para nós – os quatro irmãos – era um verdadeiro tesouro: o lixão.

Esse local ficava distante de onde morávamos. Em verdade, ficava em outra comunidade, denominada de Cachoeirinha. E este lugar, tornou-se para nós um lugar de possibilidades e descobertas. Era ali que encontrávamos livros, revistas, materiais escolares e, claro, brinquedos. Os bonequinhos Power Rangers, com suas cores vibrantes e superpoderes, eram os nossos favoritos.

Mas esses brinquedos não eram como aqueles das crianças abastadas. Aliás, eram brinquedos quebrados, esquecidos e descartados. Mas, para nós, cada pecinha tinha valor inestimável e, com paciência e habilidade, fazíamos nossas gambiarras.

Na verdade, era um desafio criativo para nós. De três ou quatro brinquedos que encontrávamos, criávamos um só. Assim, nosso Power Ranger ficava com um braço verde e outro azul, a cabeça rosa e o corpo vermelho. Era um brinquedo autêntico e genuíno, que tínhamos orgulho em mostrar para nossos amigos.

E assim, à semelhança das plantas que teimam a nascer e florescer em meio ao lixão, nós também desafiamos a escassez de recursos e, somado a um punhado de sorte e outro tanto de vontade, conseguimos fazer emergir humanidade em meio aos escombros da sociedade. 

5 comentários:

  1. Jeferson, você e teus irmãos foram então os precursores dos caçadores de tesouros.

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    1. Haha! Sim, sim! Só não tínhamos o detector de metal.

      Obrigado pelo comentário!

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  2. A literatura é curiosamente memorável. Lembrei-me do "lixão do Pedroca", perto da nossa roça no Cará-Cará/Ponta Grossa, onde eu e minha irmã coletávamos carrinhos e bonecas nos anos 1960. Amei sua escrita Jeferson! ALFREDO MOURÃO

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    1. Muito obrigado, Alfredo Mourão! E fico contente que tenha gostado da crônica.

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  3. O que não serve prá um serve para outro. Os que os descartaram provavelmente ganharam novos brinquedos e você e seus irmãos, de certa forma, também "ganharam"
    novos brinquedos, com a vantagem de terem sido montados por vocês mesmos.

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