Texto de autoria de Mário
Francisco Oberst Pavelec, técnico em agropecuária, residente em Ponta
Grossa.
Pela minha altura, quase 2
metros, nem todo muro é capaz de me ocultar totalmente aquilo que está
cercando. E, com o Cemitério São José, não é diferente.
No canto da Rua Balduíno
Taques com a Travessa Santa Cruz, o muro chega ao seu ponto mais baixo em
relação à rua. Sempre que passava por ali, visualizava os túmulos daquele
quadrante por sobre ele.
Percebeste o verbo no
passado? Entenderás.
Em um final de tarde,
quase anoitecendo, luzes urbanas já acesas, logo após atravessar a Tv. Santa
Cruz, como de costume, aproximei-me do muro para comtemplar a única coisa que é
certa nesta vida. Aquela diversidade de túmulos e imagens que o cemitério
reflete, me aproxima da necessidade de viver, e viver bem.
Atraso o passo, quase
paro, e entrevejo pelos túmulos certo movimento. Alguém visitando o passado,
alguém visitando seu futuro talvez, pensei cá comigo. Mas me chama a atenção a
claridade de um dos visitantes e a obscuridade de outro. Um quase brilhava, o
outro fundia-se lugubremente aos túmulos.
Parei. Atentamente fitei
aquela cena, buscando em toda minha racionalidade, explicações plausíveis. Sem
tirar conclusões precipitadas, raciocinei. Olhei para a calçada externa ao
cemitério, percebi-me absolutamente só. Não havia uma viva alma naquelas calçadas
e os carros pareciam simplesmente não existir.
Novamente olho para o
cemitério. Os estranhos visitantes se faziam mais distantes, porém olhavam em
minha direção. Tento mirar seus olhos, porém um arrepio profundo me percorre o
corpo todo, um arrepio de medo, de horror. São olhos claros, brilhantes,
capazes de serem vistos mesmo no escuro, porém sem vida.
Neste momento, minha
racionalidade se esvai, e vejo que ambos os seres não tocam o chão. Um gemido
surge de dentro do cemitério, e uma terceira pessoa aparece, sem brilho, sem
roupa, sem cor. Os três se entreolham e o que surgiu depois é abraçado pelo ser
brilhante. Todos somem na penumbra diante de mim.
Entendeste agora o verbo
no passado?
Nunca mais passei
caminhando naquela calçada, tampouco espiando para dentro do Campo Santo. Mesmo
de carro, procuro sempre o lado da esquerda na Balduíno. E, quando entro no
cemitério por necessidades óbvias, não vou mais até aquele canto.
Mas, pensando bem,
racionalizando, se é possível, algum desses um dia vir me buscar também. Será?
Acabei de engolir uma exclamação que não ousaria expressar por escrito aqui. Mas, valha-me Deus! é "de sério" isso? Seja como for, "de sério", sonho ou ficção, estou impressionada! Parabéns pela excelente e impactante narrativa!
ResponderExcluirGrato. Existem muitas formas de visualizar o sobrenatural. Essa é a minha!
ExcluirParabéns, Mário! Tua crônica dá o que pensar sobre o que podemos encontrar atrás dos muros da cidade. Adorei a crônica.
ResponderExcluirGrato, Simone. Nem tudo nos é encoberto por muros.
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