Texto de autoria de Rosana Justus Braga, revisora, Curitiba (natural de Ponta Grossa).
Costumava perambular nas madrugadas. Rede na mão, bem
antes do sol se espreguiçar no horizonte, ele já estava lá, sob a luz dos
postes, das eventuais lamparinas onde as mariposas vinham se debater, atraídas
pela emanação luminosa.
Um leigo diria que tais seres voláteis, de hábitos
noturnos, se parecem uns com os outros, mas sob o olhar agudo do cientista cada
qual encontrava sua identidade, sua família, seu espaço único no catálogo que vinha
se formando ao longo dos anos.
Com o dia claro, o interesse desse caçador se voltava
para os campos em torno da cidade, e sua rede ia apanhando no ar as
multicoloridas asas que flanavam por ali. Não só as borboletas, sempre
fascinantes, mas também os louva-a-deus, donzelinhas e libélulas, as cigarras,
os gafanhotos, tudo era motivo de estudo. Não os levava todos para casa, devolvia
à natureza aqueles que se repetissem em sua rede ou que já estivessem acomodados
nas belas gavetas que ele próprio confeccionava, em improvisada carpintaria, no
fundo do quintal.
Essa oficina era um reduto inviolável. Ninguém ousaria ali
entrar. Para os netos, fonte permanente de curiosidade e temor, pois sempre se
temia o infortúnio de ceder à tentação e botar os pés no famigerado recinto, atrevimento
que não passaria despercebido da vigilância do velho avô.
Um dos grandes prazeres desse entomólogo autodidata era apresentar
sua coleção de insetos. O visitante, adulto ou criança, ouviria de antemão as
recomendações e cuidados, nada de colocar dedos no vidro, puxar gavetas,
atropelar interesses. Sobretudo, que se acalmassem, pois seria uma visita de
aprendizado. Só então, podia-se entrar no recinto sagrado - a sala da coleção.
Narrador entusiasta, gostava de mesclar mitos e lendas às
suas pesquisas, e cada inseto espetado adquiria vida na imaginação de quem a
tivesse.
Foi com tal espírito cauteloso que vivenciei, ao longo da
infância e adolescência, cada incursão nesse território. Nunca com menor ansiedade ao transpor tamanho
limite. O mundo de fora e o mundo da coleção do meu avô.
Marlene Castanho
ResponderExcluirQuando a lembrança cria asas e vai... Vai viajando e colorindo, e trazendo a tona, como um presente, aquele saudoso ambiente que nos faz bem recordar... Assim é em "O Caçador de Borboletas". Um texto muito agradável de ler... Parabéns, Rosana!
Adorei seu avô Rosana! Bela crônica que me transportou para os postes de luz e seus visitantes alados em Ponta Grossa! E me recordou outra coleção, onde também havia insetos, mas estampados: a coleção de selos do meu avô, guardada no quarto do porão, que saudades!
ResponderExcluirVoava nas asas dos insetos... Alguns voam nas palavras, em notas musicais... Importante é não deixar de voar.
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